A grande maioria dos produtos voltados para o público sênior parece feita sob medida para o ambiente hospitalar
Na coluna de terça-feira, argumentei que a longevidade traz benefícios mesmo para quem não é velho, inclusive porque tem que ser apreciada como um baita mercado, já que o número de idosos deve dobrar por volta de 2050 e triplicar em 2100. No entanto, há algo em comum entre os produtos voltados para o público sênior: as cores branca e bege reinam, assim como um design que parece ter estacionado na década de 1970. Por que tudo parece feito sob medida para o ambiente hospitalar? Há um mar de possibilidades para atrair e conquistar esse grupo, mas, em primeiro lugar é preciso vencer a inércia e deixar de lado estereótipos e narrativas ultrapassadas.
Somente nos Estados Unidos, cerca de dez mil pessoas completam 65 anos diariamente e, até 2030, todos os baby boomers (os nascidos entre o fim da 2ª. Guerra e o começo dos anos de 1960) terão ultrapassado essa marca. Estar na casa dos 60 ou 70 não tem feito tanta diferença na vida de boa parte desses idosos, que se mantêm ativos, conectados – muitos trabalhando – e cheios de planos. A questão financeira também pende favoravelmente para os mais velhos, que com frequência são os provedores da família e donos de uma reserva financeira.
Embora esse seja o mundo real, no universo paralelo do design é como se as pessoas acima dos 65 estivessem encerradas em suas casas à espera do fim. Felizmente, há ativistas nessa área, como Jeremy Myerson, professor emérito do Royal College of Art, que acabou de lançar o livro “Designing a world for everyone: 30 years of inclusive design” (“Projetando um mundo para todos: 30 anos de design inclusivo”). Num TED Talk realizado em 2019, ele não mediu as palavras: “por que o design é tão ruim quando se aplica a esse público? Por que os padrões são tão baixos? Por que não criamos produtos que atendam às mudanças graduais que acompanham a idade com a visão estética que é usada para outras faixas etárias?”.
Myerson, que passou dos 60, afirma que não pretende viver numa espécie de “gueto de produtos feitos para pessoas com necessidades especiais” e critica: “uma das maiores bobagens que ainda ouço é que esse mercado não é suficientemente atraente. Há mais idosos do que crianças no mundo, seremos 1.5 bilhão em 2050!”. Quando se refere a repensar o design, cita como exemplo a cadeira ou scooter motorizada, produto considerado top de linha para quem tem limitações motoras. “Ok, ele é funcional, mas não pode entrar numa loja, não pode ser guardado em sua casa. Se ficar do lado de fora, é um aviso de que alguém frágil mora ali. Podemos fazer melhor”, alfineta.
Queremos idosos enfurnados em casa, isolados do mundo, ou ativos e participando da sua comunidade? O que queremos que as novas tecnologias façam por nós: estamos devidamente empenhados para que a abordagem tecnológica não substitua a interação humana? A abordagem médica continuará a ver a velhice como sinônimo de decrepitude e dependência e o velho como um ente passivo e indefeso? Essas são as questões que Myerson propõe, lembrando que o design precisa se envolver num projeto de envelhecimento baseado em novas conexões e aspirações. Ou, como resume: “queremos uma vida cheia de anos ou anos cheios de vida?”.