Profissionais de cuidados paliativos asseguram o bem-estar de quem tem uma doença incurável, respeitando os limites do paciente, sua autonomia e crenças
Quando já não é possível realizar intervenções médicas que possam curar a doença de uma pessoa, entram em campo os profissionais de cuidados paliativos. Essa metodologia busca minimizar o sofrimento e melhorar a qualidade de vida de pacientes e familiares que enfrentam os problemas associados a doenças incuráveis. Ao acolher essas pessoas, a equipe mostra que cuidar é tão importante quanto curar, proporcionando bem-estar para se viver até o fim com dignidade. Para isso, faz-se necessário um tratamento multidisciplinar, com o objetivo de facilitar a aceitação da doença e reduzir os efeitos negativos da adaptação à nova rotina. É por isso que, além do acompanhamento médico, os cuidados paliativos incluem o acompanhamento de enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, assistente social e, até mesmo, conselheiro espiritual.
Nessa mudança de paradigma, em que o foco é cuidar, o enfoque não se trata apenas do controle dos sintomas físicos, mas inclui todo o apoio do ponto de vista psicológico, para lidar com a angústia e ansiedade, por exemplo; além da abordagem das necessidades espirituais de cada paciente e as demandas dos familiares, oferecendo uma forma mais humanizada de lidar com o problema. “É o entendimento da morte como um processo natural da vida, entendendo que, mesmo não sendo possível a cura de uma doença, o cuidado é sempre uma possibilidade, e ainda há muito que pode ser feito”, afirma a enfermeira, pós-graduada em saúde pública, Lívia Nishimura, gestora do Contigo —programa gratuito de cuidados paliativos da operadora de saúde Vitallis.
Para que essas necessidades sejam atendidas, e o cuidado seja integral, os profissionais lançam mão de uma relação empática com os pacientes, fundamentada no ouvir e tornar-se sensível às necessidades dos pacientes, mais do que em habilidades técnicas para diagnosticar e tratar a doença. Segundo Nilmar Niz e Sousa, enfermeiro do programa Contigo, o cuidado paliativo propõe o desafio de cuidar com competência científica sem, no entanto, esquecer-se da valorização do ser humano.
“Esse olhar humano, voltado para o cuidado, é uma qualidade ímpar para os profissionais da assistência paliativa”, afirma. Ele conta que a equipe de enfermagem são os profissionais de primeiro contato com os pacientes e familiares. “Nós temos esse contato diário, vivemos a rotina dos pacientes. Temos que estar sempre atentos para, se for o caso, encaminhar a demanda para o psicólogo ou conselheiro espiritual”, conta.
Os profissionais envolvidos nos cuidados paliativos não medem esforços para melhorar a qualidade de vida de quem tem uma doença incurável, mas todas as ações respeitam os limites do paciente, sua autonomia e crenças. “Sempre é necessário enxergar a pessoa inteira —seus valores, trajetória, medos e desejos— e não apenas a sua doença”, analisa o conselheiro espiritual do programa Contigo, Reinaldo Orício da Silva. Até porque, afirma ele, a iminência da morte e da perda de um ente querido é uma situação que pode causar um enfrentamento com a espiritualidade, com o que é justo ou não, em casos de doenças severas. “Esse processo independe de crença religiosa. A espiritualidade é algo muito particular e pessoal; meu trabalho é construir uma ponte para trazer conforto a pacientes e familiares de modo que eles aceitem o processo que estão vivendo”, complementa.
No processo de cuidar da morte do outro, esses profissionais fazem descobertas, sofrem, adquirem autoconhecimento, mas mantêm a possibilidade da reconciliação da vida com a morte. “Meu trabalho me mostrou que nada é mais humano do que estar perto e cuidar de quem se ama na hora da morte”, declara Silva. Os cuidados paliativos consideram, ainda, a família uma unidade de cuidado, que também deve receber assistência durante todo o tempo de acompanhamento de seu paciente, prosseguindo até depois de seu óbito, no período de luto. Para os familiares de pacientes do Contigo, por exemplo, o acompanhamento segue até três meses após o falecimento do paciente. Como símbolo dessa trajetória de ressignificação da vida, a família recebe uma semente de girassol para plantar e manter viva as boas lembranças.
No entanto, para que esses profissionais consigam desenvolver seu trabalho com sucesso, torna-se imprescindível também o cuidado com a saúde mental de cada integrante da equipe. “É um trabalho de condução das dificuldades subjetivas dos pacientes e familiares, mas também dos nossos colegas de equipe. Sempre temos que estar muito atentos para filtrar a carga emocional do trabalho em si, e, se for o caso, encaminhar esse colega para também receber um suporte emocional”, avalia Flávia de Fátima Galdino Pereira, psicóloga do Contigo. Segundo ela, o profissional de cuidados paliativos representa uma figura de segurança, de respeito à vida, o que se une perfeitamente com o trabalho de um psicólogo. “É preciso ter um olhar humanizado para aquela família, para aquele paciente. Olhar o paciente de uma forma mais humana e individualizada, entendendo suas dores”, afirma.
A equipe multidisciplinar de cuidados paliativos deve ter qualificação técnica, empatia, preparação física e psicológica para lidar com as situações, atuando com humanidade e compaixão. A função é complexa e exige treinamento aprofundado. Motivo pelo qual a Vitallis investe na qualificação de seus profissionais e fornece para a equipe treinamentos e pós-graduação na área. Segundo Lívia, ainda é preciso desmistificar o conceito de que cuidado paliativo é para pacientes que estão destinados a morrer. “A principal dificuldade, hoje, é a cultura brasileira que ainda entende o cuidado paliativo como manejo a ser adotado somente nos casos em que os pacientes estão à beira da morte. Nosso principal desafio é esclarecer o que são e por que devem ser feitos precocemente, com um atendimento integrado”, afirma.